Will still
Stade de Reims, 2022 - Presente
Em qualquer momento de minha vida, se alguém tivesse me dito que eu seria treinador de uma equipe da Ligue 1 aos 30 anos, eu teria pedido para me dar um soco na cara.
Teria sido uma suposição absurda.
A ideia de que eu, aos 30 anos, comandaria uma equipe que duelasse com Neymar, Kylian Mbappé, Sergio Ramos e Marco Verratti, treinada por Christophe Galtier, era inverossímil.
Na vida, porém, podem acontecer coisas malucas.
Nunca me coloquei fronteiras ou limites no que posso alcançar, tampouco estipulei metas concretas. Quando comecei como treinador, não planejei chegar à primeira divisão da França em uma determinada idade.
Não é o meu jeito de ser. O mais importante para mim é desfrutar do que estou fazendo. É viver o presente.
Suponho que isso signifique que nunca penso no que está por vir. Então, certos momentos ou conquistas acabam por me surpreender. Ao longo de minha carreira, tive vários desses momentos que você precisa se beliscar para saber se não está sonhando.
Um deles foi quando o Stade de Reims me telefonou pela primeira vez.
"Acabamos de contratar Óscar García como novo treinador, e há tempos temos te monitorado", me disse o diretor-geral. "Quer vir aqui para conversarmos?”.
“ASSIM, ME TORNEI AUXILIAR TÉCNICO NA LIGUE 1 AOS 28 ANOS”
Eu mal podia acreditar. Era totalmente surreal que o Reims soubesse quem eu era, e mais ainda que tivessem monitorado meus passos como treinador. Eu não era um cara conhecido fora da Bélgica, onde nasci e cresci, e onde tinha passado toda a minha carreira até então. A sensação é que a Bélgica é muito pequena e muito fechada em si mesma.
Fui ao Reims e me ofereceram a vaga de auxiliar técnico de Óscar.
Eles disseram que gostavam dos meus treinamentos. Tinham ido ver alguns treinos sem que eu nem soubesse, e gostaram da energia que eu transmitia e o quanto conseguia tirar dos jogadores. Disseram que tinham outros auxiliares especialistas nas análises de vídeo e na preparação dos jogos, mas que necessitavam alguém para ajudar no campo.
Não pensei duas vezes e aceitei a proposta.
Assim, me tornei auxiliar técnico na Ligue 1 aos 28 anos, uma liga que conta com alguns dos melhores times do mundo. Eu faria parte de uma comissão técnica que iria enfrentar PSG, Olympique de Marselha, Lyon e tantas outras equipes. Equipes incríveis.
Eu tinha percorrido um longo caminho desde a adolescência na Bélgica, quando me dei conta de que nunca iria triunfar como jogador.
Sou inglês, meus pais são ingleses, mas passei a maior parte de minha vida na Bélgica. Aos 18 anos, aproveitei a oportunidade de ir à universidade e passei um tempo na Inglaterra. Foi quando me dei conta de que o futebol era muito mais do que simplesmente jogar.
Havia os treinadores, as análises, os olheiros, a fisioterapia, a preparação física. Ser treinador me pareceu a segunda melhor opção. Era o mais próximo que podia sentir daquela adrenalina de jogar.
"FOI UM NÃO ATRÁS DO OUTRO. PORTA ATRÁS DE PORTA QUE ME BATIAM NA CARA”
Minha primeira experiência como técnico foi na base do Preston North End. Foi algo fantástico. Eu já tinha treinado antes, com meu irmão na Bélgica, mas nada naquele nível. "Esses garotos são bons de verdade!" pensei.
Depois daquilo, tive a certeza de que ser treinador era o que eu queria.
Quando retornei à Bélgica depois de terminar a universidade, eu queria adquirir experiência no futebol profissional. E fui bater à porta de alguns lugares.
Descobri o endereço de muita gente do futebol belga e fui vê-los.
"Sou jovem e não sou ninguém", eu dizia. "Mas tive uma experiência no Preston e tenho os conhecimentos da universidade. Posso de alguma maneira, jeito ou forma ajudá-los?”
Foi um não atrás do outro. Porta atrás de porta que me batiam na cara.
Algumas pessoas me disseram que ligariam em duas semanas, mas nunca mais responderam. Eu estava perdendo as esperanças.
Então, o último técnico que eu havia procurado me abriu as portas. Foi o Yannick Ferrera, um jovem treinador belga que dirigia o Sint-Truiden, da segunda divisão da Bélgica. Eu tinha jogado nas categorias de base do clube, e tinha o deixado por último na lista porque não queria voltar a um clube que já tinha estado. Naquele momento, porém, o que eu mais queria era uma oportunidade onde quer que fosse.
“Consegue filmar um jogo?” Yannick me perguntou.
"O PROPIETÁRIO ME LIGOU PRATICAMENTE LOGO APÓS DESPEDIR O TREINADOR.
‘VOCÊ ASSUME', ME DISSE”.
"Sim, consigo fazê-lo”, respondi.
"Consegue editar o vídeo?”
"Sim, consigo editar o vídeo”.
"Nosso primeiro adversário na liga joga amanhã. Vá ao jogo, grave, edite e me dê a sua opinião em dois dias”.
Então, lá fui eu.
Eu tinha muita vontade de me testar. Não consigo nem dizer quantas vezes revi o jogo depois de gravado. Queria mostrar a Yannick que eu conseguia ver o que tinha acontecido naquela partida que fui assistir no meio do nada.
Levei a Yannick o que havia reunido.
"Isto é ridículo", me disse. “Você fez muita coisa!”
Ele obviamente gostou do que viu e me ofereceu o cargo de estagiário não remunerado no Sint-Truiden.
No começo, eu fazia as análises de vídeo, mas com o tempo passei a ganhar mais e mais oportunidades no gramado. Sem que houvesse nenhum anúncio oficial, me tornei uma espécie de auxiliar técnico. Primeiro, eu organizava as jogadas de bola parada. Depois, treinos de posse de bola e, de repente, estava comandando exercícios de passes. Cada vez eu participava mais dos treinamentos.
"COMO ME SENTIA? CHEIO DE MEDO”
Tudo isso por causa do Yannick, e também foi graças a ele que tive minha seguinte oportunidade.
Virei auxiliar no Lierse, na mesma divisão, e quando eu tinha 24 anos - cerca de três anos depois de meu primeiro trabalho com Yannick - o treinador foi despedido.
O proprietário do clube me ligou praticamente logo após demitir o treinador.
“Você assume", falou.
“O quê?, respondi.
"A partir de amanhã, você é o treinador. Você assume o cargo”.
Respondi, com todo o respeito, que ali havia outros treinadores com bem mais experiência que eu, a quem ele devia considerar. Foi, basicamente: "Obrigado, mas não”.
"Não, não", ele continuou. "Não me importam os outros. Gosto de você. Você tem boas ideias. O cargo é seu”.
Eu realmente não tinha outra opção. Assim, aos 24 anos, virei treinador principal - mesmo que interino - de um clube da segunda divisão belga.
“QUANDO MENINO, FIQUEI OBCECADO PELO 'FOOTBALL MANAGER'. EU E MEU IRMÃO JOGÁVAMOS SEM DESCANSO”
Como eu me sentia? Cheio de medo.
Mas fomos muito bem sob meus comandos. Estávamos em penúltimo na liga quando assumi o cargo em outubro, mas conseguimos reverter a situação e subir na tabela.
Foi uma loucura como meu mundo tinha virado de ponta-cabeça. Passei de ser um completo zé-ninguém para ser uma pessoa conhecida, pelo menos, localmente. De repente, me paravam nas ruas e eu aparecia nas notícias na televisão.
Mesmo sendo técnico de uma equipe profissional, eu também seguia testando coisas no Football Manager.
Nunca havia pensado que o Football Manager tivesse tido alguma influência na minha carreira na vida real, mas refletindo sobre isso agora, fica claro que teve. Quando menino, fiquei obcecado pelo jogo de computador, algo que provavelmente acendeu a chama que tenho agora como treinador à beira do gramado.
Eu e meu irmão jogávamos sem descanso. Não nos deixavam ter um PlayStation, então jogávamos Football Manager no computador da família.
Nós gostávamos de montar um elenco, escolher uma equipe, organizar os treinamentos, assegurar que o time estava indo na direção correta - todos os detalhes. Não havia nada melhor que isso, mesmo que fosse virtual. E ali estava eu, fazendo aquilo na vida real. Recordo que, quando estava no Sint-Truiden, eu tentava ganhar a liga com o clube também no jogo de computador.
No entanto, com o desenrolar da minha carreira (no mundo real!), passei a ter menos tempo para me dedicar ao jogo de computador como fazia antes. No Reims, comecei a ficar muito ocupado.
“COM A MESMA INQUIETAÇÃO QUE TE DÁ NO FOOTBALL MANAGER, EU QUERIA TER OUTRA OPORTUNIDADE COMO TREINADOR PRINCIPAL”
Ser auxiliar de Óscar foi incrível. Depois de meia temporada, tive que regressar à Bélgica para concluir minha formação como treinador. Uma vez concluída, o Reims me pediu para retornar ao clube.
Foi então que aconteceu algo quase impensável.
Tocou o meu telefone. Eram os proprietários.
"Óscar está de partida", disseram. "Estas são as condições de seu contrato, portanto você não pode sair. Queremos que assuma o cargo".
Não tive muita opção, nem tempo para pensar.
Tive uma rápida passagem como treinador do Beerschot, na primeira divisão belga em 2021, depois de três anos como auxiliar no clube. E fui muito bem. Acabamos a temporada na zona intermediária da tabela de classificação, mas o clube decidiu trazer um novo técnico na pré-temporada. Eu havia criado uma certa relação com o elenco, que me fez decidir não aceitar retornar ao cargo de auxiliar.
Foi então que decidi sair, e de lá acabei indo ao Reims.
Com aquela mesma inquietação que te dá no Football Manager, eu queira ter outra oportunidade como treinador principal. Mas como em todas as outras etapas de minha carreira, eu não tinha planejado nada. Em nenhum momento pensei que seria técnico do Stade de Reims. Ainda menos, naquele exato momento.
Era outubro de 2022, e a princípio me ofereceram a vaga até o Mundial do Catar. Isso significava comandar a equipe em seis jogos e tentar somar o máximo de pontos possíveis. Depois, disseram, vamos reavaliar a situação.
“ASSIM, AOS 30 ANOS, AQUI ESTOU: NO COMANDO DE UM CLUBE DA LIGUE 1”
Foi outro daqueles momentos de se beliscar para conferir se não era um sonho. Mas as coisas iam tão rápidas, e havia tanto o que fazer, que não tive nem tempo de refletir sobre o fato de ter me tornado técnico de uma equipe da Ligue 1, mesmo que de forma interina.
Três dias depois, eu estava no banco de reservas para comandar o Reims contra o PSG pela Ligue 1.
Esses momentos não ficam mais alucinantes que isso: passar ao lado de Mbappé, Verratti, Gianluigi Donnarumma, Marquinhos, Ramos, Danilo e os demais jogadores do PSG no túnel. Uma loucura.
Não me entendam mal. Eu não estava apenas maravilhado. Tive uma semana muito estressante antes do jogo. Meu principal pensamento era: "Só espero que não nos amassem, tipo uns 6-0". Sempre existe essa possibilidade quando se enfrenta um rival como o PSG.
Depois, a medida que o jogo se aproximava, comecei a relaxar. E quando os jogadores sobem ao gramado para fazer o aquecimento, algo acontece em você, como treinador. Não sei bem explicar, mas todo o nervosismo desapareceu e minha mente estava incrivelmente concentrada. Era a hora do jogo, e eu tinha um trabalho a fazer.
Lionel Messi tinha se machucado na Champions League no meio de semana, portanto estava fora de combate. Galtier ainda deu descanso a Neymar e Achraf Hakimi, que ficaram no banco. Claro que a equipe deles seguia sendo muito forte, mas aquilo aumentou nossas esperanças.
Meus jogadores executaram o plano de jogo de forma brilhante e conseguimos um empate sem gols. Neymar e Hakimi entraram na partida, mas eles seguiram sem fazer gol. Era a primeira vez na temporada que o PSG não marcava. Era outubro, e ninguém tinha conseguido passar um jogo contra eles sem ser vazado desde março. Foi uma sensação incrível conseguir tal feito em meu primeiro jogo à frente do Reims.
O ambiente no clube começou a mudar, e entramos em um momento mais positivo.
“SE PUDER PASSAR TODOS OS DIAS COM AS CHUTEIRAS NOS PÉS, SOBRE O GRAMADO, COM 26 JOGADORES — QUE SÃO MUITO, MUITO BONS— E TRÊS SACOLAS COM BOLAS, ESTAREI FELIZ”
Quando assumi o comando, tínhamos uma vitória e quatro derrotas em nove partidas. Estávamos na zona do rebaixamento.
Aí, nos seis jogos que fiz antes da parada para a Copa do Mundo, nos mantivemos invictos, ganhamos duas vezes e subimos à décima primeira posição na tabela. A diretoria estava tão contente com o resultado e, sobretudo, com a melhora do estado de ânimo no clube, que me efetivaram no cargo.
Assim, aos 30 anos, aqui estou: no comando de um clube da Ligue 1. Não poderia estar mais feliz.
É um trabalho duro, há pressão e há atenção. Mas consigo deixá-las de lado para focar no meu trabalho.
Não gosto dos holofotes e da atenção que vêm com o cargo de treinador principal.
Não sou muito extrovertido. Sou aberto e relaxado com as pessoas que conheço, mas não me sinto confortável recebendo tanta atenção.
“MAS O MENINO QUE HÁ EM MIM ME DIZ PARA SEGUIR FIRME NO SONHO DE TREINAR O WEST HAM”
Mas se eu puder passar todos os dias com as chuteiras nos pés, sobre o gramado, com os 26 jogadores - que são muito, muito bons! - e três sacolas com bolas, estarei feliz. Eu o faria de graça, portanto tê-lo como trabalho é a realização de um sonho.
Há um monte de momentos específicos que eu destacaria, mas o melhor de meu trabalho é a sensação de construir algo juntos; de trabalhar em algo coletivamente, colocá-lo em prática e produzir resultados. Pode ser que não tenhamos os melhores jogadores, mas como grupo podemos criar algo especial juntos. Como falei, nunca planejei a minha carreira. Olhando à frente, eu provavelmente aceitarei o que aparecer pelo caminho.
Mas o menino que há em mim, que passou todas aquelas horas se convertendo em um dos melhores treinadores do mundo e ganhando tudo no “Football Manager”, me diz para seguir firme no sonho de treinar o West Ham. Sou um grande torcedor do West Ham, e isso seria realmente um sonho.
Evidentemente, ainda tenho um longo caminho para percorrer. Portanto, tenho muito trabalho pela frente e muitas horas a dedicar ao mundo real.
Estou preparado para o desafio.
Experimente a sensação mais próxima de ser um verdadeiro treinador no Football Manager 2023. O novo jogo já está à venda.