Muitas dúvidas sobre a reformulação do elenco e um futuro incerto depois que Zinedine Zidane deixou o banco de reservas do Real Madrid. Este era o cenário que Carlo Ancelotti herdou ao chegar, em junho de 2021, para a sua segunda passagem como treinador do clube merengue. Nas casas de apostas, o técnico italiano não era o principal favorito para assumir o posto. Tampouco o Real era visto como principal candidato ao título espanhol. Menos ainda, claro, para ganhar a liga com tanta antecedência.
Foi o 35° título espanhol do Real Madrid. Conquista que fez de Ancelotti o primeiro treinador a vencer as cinco principais ligas europeias: a Serie A, com o AC Milan (2004); a Premier League, com o Chelsea (2010); a Ligue 1, com o PSG (2013), a Bundesliga, com o Bayern de Munique (2017) e a La Liga, com o Real Madrid (2022).
Recorde que fala tanto sobre a longevidade do técnico italiano em dirigir no mais alto nível, quanto de seu sucesso, propriamente - acumula 22 títulos no total -. “Me enche de orgulho. Gosto do que faço, e ter vencido as cinco ligas significa que tenho feito bem. Estou orgulhoso de estar no Real Madrid e de ganhar títulos com este clube; quero mais”, disse Ancelotti.
“Conseguimos administrar bem o elenco, os jogadores têm sido muitos sérios e profissionais. Meu trabalho foi bastante simples. Todos respeitaram as minhas decisões e construímos um grande ambiente de trabalho", resumiu o italiano, sobre o caminho do título.
Nossos treinadores analisam as principais chaves táticas desse caminho. Trajetória que esteve marcada por nomes próprios como os de Karim Benzema e Vinícius Júnior, mas também por um grande trabalho coletivo.
Profundidade ofensiva pelas pontas
O sistema ofensivo utilizado por Ancelotti durante toda a temporada foi o 4-3-3. Esta formação se caracteriza por ser uma das mais ofensivas, mas o treinador italiano fez adaptações em função das características de seus jogadores para favorecer o coletivo. Com isso, realçou as virtudes de seus jogadores mais decisivos no campo rival.
Um desses jogadores é Vinícius Junior. O atacante brasileiro colocou à disposição de sua equipe todo seu repertório técnico para ser decisivo, o que consequentemente aumentou também as participações, em zonas de finalização, de seu companheiro Karim Benzema (abaixo).
Para que isso acontecesse, Ancelotti desenhou as estruturas táticas necessárias para fazer com que as ações do extremo brasileiro fossem mais decisivas.
Na ponta esquerda, onde Vinícius se posiciona, foram geradas inúmeras situações de 1 contra 1 ou 2 contra 1 que terminaram por encontrar Benzema dentro da área rival, dando ao atacante francês a possibilidade de finalizar a gol. Para isso, o treinador italiano posicionou o ponta brasileiro na máxima amplitude possível e em linha de passe com o meio-campista mais próximo a ele.
Ademais, Ancelotti traçou um plano para otimizar as ações de Vinícius. Antes das intervenções do ponta brasileiro, a equipe congestiona o jogo interior com os meio-campistas e até Benzema, que sai de posição para atrair os defensores adversários. Uma vez que Vini encontra espaço às costas do lateral de seu setor, seus companheiros tentam acioná-lo seja com um passe em profundidade ou em situação de 1 contra 1, com terreno a explorar pela frente.
Desta maneira, Vinícius mostra sua capacidade de desequilibrar graças à sua qualidade técnica no controle de bola, nas conduções e nas finalizações, mesmo quando está em alta velocidade. Posteriormente, e de acordo com o que o lance demanda, tenta o passe para Benzema, em zona de finalização, ou termina ele mesmo a jogada.
Benzema, uma figura decisiva
Desde a chegada de Ancelotti, a inteligência tática do atacante francês aumentou de maneira exponencial em prol da equipe. Seu dinamismo dentro do jogo coletivo o torna, em muitos momentos, indetectável para os rivais, o que aumenta suas participações decisivas. Isso, tanto em zona de criação das jogadas - quando seus companheiros não encontravam fluidez ofensiva -, quanto dentro da área adversária. Em ambos os cenários, costuma se habilitar como potencial receptor do passe, aproveitando os espaços livres que se abrem na defesa rival.
Em pouquíssimas ocasiões, Benzema permite a marcação dos defensores. Quando ocorre, emprega seu sentido tático para liberar um companheiro em amplitude, movimentando-se em direção ao lado mais frágil da defesa adversária.
Nos últimos metros, Benzema tem demonstrado ser um finalizador que parece se camuflar entre os defensores, quase como se nenhum deles pudesse identificar sua presença. Na hora de receber a bola, se posiciona muito bem, sempre com absoluto controle de onde está o gol e do melhor ângulo para uma desejada finalização. Características que facilitam uma rápida definição da jogada, o que comumente acontece com apenas um toque na bola ou, quando o passe exige, dois toques.
Seus movimentos nessas ações de ataque são relativamente simples: segura a corrida para permanecer fora da vigilância defensiva, logo avança e, finalmente, confia em seu salto e sincronização para finalizar com precisão (abaixo).
Um contra-ataque letal
O Real Madrid de Ancelotti tem um selo de identidade próprio na hora de realizar seu contra-ataque. Este, executa-se depois de um adequado e eficaz trabalho defensivo, recuperando a posse em zona de criação para, depois, surpreender com breves, rápidas e seguras transições ofensivas com a bola.
Uma ação que se desenvolve com a participação de poucos jogadores e rápidas combinações entre eles. E que tem como objetivo buscar a profundidade ofensiva. Isso impede que o adversário se reorganize defensivamente em seu próprio campo. Assim, facilita a progressão do contra-ataque de maneira eficaz, com a intenção de incrementar as possibilidades de bater o rival com jogadores da primeira linha - Benzema -, da segunda - Valverde ou Modric - e até da terceira linha de ataque, com os laterais.
Para chegar às zonas de finalização com garantias, Modric e Kross são os encarregados de ativar a primeira onda do contra-ataque. Com eles, a bola costuma chegar em melhores condições a Vinícius, Benzema e ao extremo direito, posição na qual se alternam Marco Asensio e Rodrygo. Estes jogadores, previamente identificaram os espaços livres deixados pelo rival em seu processo de reorganização defensiva, para ocupá-los e tirar proveito em suas ações subsequentes.
Já nas zonas de finalização, o talento de cada um deles termina o serviço para chegar ao gol. Algo que ficou comprovado em muitas rodadas da La Liga.
Solidez defensiva
Ancelotti foi capaz de solucionar um dos problemas que a equipe vinha convivendo nas últimas temporadas: a falta de solidez defensiva. O time apresentou uma dinâmica defensiva confiável, com uma estrutura em bloco médio, na qual a prioridade é a compactação de suas estruturas. Reduzindo, assim, os espaços livres ao rival para evitar ser superado.
Éder Militão e David Alaba são os defensores que lideram e dirigem seus companheiros para que se mantenham fortes e induzam as ações ofensivas do adversário a acontecerem pelos corredores externos. Nessas posições, surgem ajudas defensivas para criar estruturas de superioridade numérica que impeçam ou dificultem ao máximo a evolução do rival em sua própria metade do campo. Thibaut Courtois também é um dos nomes próprios da defesa do Real Madrid, relevante com intervenções destacadas em momentos decisivos.
Chama a atenção ainda o assédio ao jogador que tem a bola. Isto para dissuadir possíveis linhas de passe que possam ser geradas em sua estrutura. Uma atitude que temporiza todo o avanço em direção aos atacantes rivais.
Por outro lado, o Real Madrid é uma equipe reativa defensivamente. Então, quando um rival comete um erro de passe ou de controle de bola, os jogadores mais próximos a ele podem saltar à pressão para tentar recuperar a posse de bola e iniciar seu dispositivo ofensivo de contra-ataque.
Redacción: The Coaches' Voice