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Um novo caminho

Um novo caminho
Redacción
The Coaches' Voice en español
Publicado el
21 de diciembre 2021

Gianfranco zola

West Ham, 2008-2010

É curioso, mas o futebol que fui introduzido enquanto jogador me estimulou a querer ver o jogo ser praticado de outra forma quando, anos depois, virei treinador. 

Cresci jogando na Itália em uma época que o futebol italiano basicamente privilegiava parar o adversário.

Não havia tanta atenção ou preocupação com o que nós iríamos fazer. Os treinadores só queriam encontrar formas de frear o rival. Era o jogo 'à italiana'.  
Apesar de respeitar esta filosofia - e desfrutei do sucesso jogando em diferentes sistemas de estilos italianos -,  sentia que atuando daquela maneira os jogadores perdiam algo de liberdade. Ficavam mais preocupados com o que o rival estava fazendo. Desta forma, a equipe perde um pouco de sua criatividade.  

Zola, em uma partida da seleção italiana na Eurocopa de 1996. Clive Brunskill/AllsportUK
Zola, em uma partida da seleção italiana na Eurocopa de 1996. Clive Brunskill/AllsportUK

Como jogador (acima), eu sempre estava pensando em fazer gol, superar um rival com um drible, criar oportunidades para um companheiro de equipe. 

Era este o foco que eu gostaria para meu time. Portanto, quando virei técnico, decidi que esta seria a minha filosofia: treinar minhas equipes para que sempre valorizem a posse de bola, tentem controlar o jogo e criar oportunidades de gols.  

Houve dois treinadores, em especial, que eu admirava e tentei usar como base para minha filosofia: Pep Guardiola e Zdenek Zeman. Pep é obviamente mais conhecido e, provavelmente, alguém que todo mundo tente copiar. Mas Zeman (abaixo) teve uma enorme influência sobre o futebol italiano e sobre mim. 

“QUANDO VIREI TÉCNICO E ME APROFUNDEI NOS ESTUDOS DO JOGO, ME DEI CONTA DA IMPORTÂNCIA QUE TEM A TÁTICA” 

Ele trabalhou na Itália por muito, muito tempo - quase 50 anos no total - e foi numa época, como falei anteriormente, que o futebol italiano privilegiava muito a solidez defensiva e a vontade de impedir que o rival fizesse gol.  

O futebol de Zeman era totalmente diferente. Era conhecido por ser ofensivo. Estava cheio de movimentos de ataque e jogadores fazendo triangulações por todas as partes. Eu ficava encantado de ver suas equipes em ação e queria levar elementos daquele futebol para a minha forma de treinar. 

A carreira de Zdenek Zeman na Itália remonta a 1974. Mario Carlini/Iguana Press/Getty Images
A carreira de Zdenek Zeman na Itália remonta a 1974. Mario Carlini/Iguana Press/Getty Images

Como jogador, sempre pensei que ganhar tinha a ver com ser melhor tecnicamente ou mais inteligente e rápido que o rival. 

Mas quando virei técnico e me aprofundei nos estudos do jogo, me dei conta da importância tática para tirar o melhor dos jogadores. Criar vantagens numéricas em partes específicas do campo era algo que realmente nunca havia pensado enquanto atleta. Então, precisava ter uma outra mentalidade como treinador. 

No começo, foi um grande desafio. Durante minha carreira como jogador, nunca pensei que viraria técnico. Eu simplesmente desfrutava de jogar futebol de um jeito que era natural para mim. Aprendi a valorizar a importância do treinador na hora de criar situações para que os jogadores evoluam.

“JOGUEI NO CHELSEA POR MUITO TEMPO, ENTÃO IMAGINEI QUE EXISTIA A POSSIBILIDADE DOS TORCEDORES DO WEST HAM NÃO ME RECEBEREM DE BRAÇOS ABERTOS”

Minha primeira experiência como técnico veio um ano depois de pendurar as chuteiras, quando recebi uma ligação de Demetrio Albertini. Ele era o vice-presidente da Federação Italiana de Futebol e me convidou para trabalhar como auxiliar de Pierluigi Casiraghi no Sub-21 da Itália.

Não estava nos meus planos, mas de repente eu estava trabalhando com um grande amigo como Pierluigi (abaixo) e a experiência foi um primeiro grande degrau na minha transição para treinador.

Pierluigi Casiraghi levou a Itália às semifinais da Euro sub-21 de 2009.Phil Cole/Getty Images
Pierluigi Casiraghi levou a Itália às semifinais da Euro sub-21 de 2009.Phil Cole/Getty Images

Quando surgiu a oportunidade de ir ao West Ham (abaixo) em 2008, imaginei que existia a possibilidade de não me receberem de braços abertos. Afinal, eu havia jogado no Chelsea por muito tempo - era a minha equipe -, então poderia haver uma rejeição por parte dos torcedores.

Como se viu depois, não era preciso se preocupar nesse sentido. 

Os torcedores do West Ham foram incríveis comigo desde o princípio e desenvolvemos uma grande conexão. 

“PARA MIM, A EQUIPE PERFEITA CONSEGUE TER O EQUILÍBRIO EXATO ENTRE JUVENTUDE E EXPERIÊNCIA”

Quando a torcida gosta do seu trabalho, o respaldo é total. Por sorte, eles me aceitaram e gostavam do que viam em campo. A torcida aprovou o que estávamos tentando fazer com o time, e nos deram total apoio. 

Jogamos um futebol muito bom, especialmente em meu primeiro ano no clube, e o fazíamos com o espírito que os torcedores queriam ver. 

Subimos vários jogadores da base e fizemos bem sob circunstâncias difíceis. 

Gianfranco Zola substituiu Alan Curbishley no cargo de treinador do West Ham em setembro de 2008.Mike Hewitt/Getty Images
Zola substituiu Alan Curbishley no cargo de treinador do West Ham em setembro de 2008.Mike Hewitt/Getty Images

Sempre dei muita importância em utilizar jogadores jovens. Para mim, a equipe perfeita consegue ter o equilíbrio exato entre juventude e experiência. Isso porque um estimula o outro: os jovens querem ser melhores que os mais experimentados que, por sua vez, não querem perder o lugar no time para os novatos. A consequência é uma competição benéfica no elenco. 

Eu tive sorte no West Ham porque havia muita qualidade surgindo nas categorias de base. Eram conhecidos por ter uma boa equipe na base e, com minha experiência, pude comprovar isso.

“NO WATFORD, HAVIA UMA POLÍTICA DIFERENTE. A VISÃO ERA MAIS A CURTO PRAZO; O QUE NÃO É NECESSARIAMENTE PIOR, MAS PRECISEI ME ADAPTAR”

Estava surgindo Jack Collison (abaixo). Assim como Junior Stanislas e James Tomkins. Eram jogadores muito, muito bons, além de grandes profissionais. 

Eles se adaptaram muito bem à rotina do time principal e, graças a isso, conseguimos jogar um bom futebol. 

O êxito que tivemos - tanto na qualidade do jogo apresentado, quanto no feito de usar a base - ajudou a construir a conexão que tive com os torcedores do West Ham. Isso foi muito importante porque te dá liberdade para trabalhar da forma que considera mais adequada. Você ganha tempo para trabalhar o projeto e desenvolver as coisas que considera necessárias. Às vezes, coisas que tomam tempo. 

Jack Collison descreve Zola como ''alguém que sempre queria te desenvolver como jogador''. Shaun Botterill/Getty Images
Jack Collison descreve Zola como ''alguém que sempre queria te desenvolver como jogador''. Shaun Botterill/Getty Images

A história foi outra no Watford, onde havia uma política diferente. Ali, a visão era mais a curto prazo. O que não é necessariamente pior, mas exigiu de mim uma adaptação. 

O proprietário, Gino Pozzo, tinha suas próprias ideias de como deveria ser conduzido o clube e trouxe muitos jogadores por empréstimo. 

O que tinha seus benefícios, afinal, podíamos contar com vários atletas de outros clubes que se vinculavam ao Watford. Era uma grande vantagem. 

“VICARAGE ROAD ENTROU EM ERUPÇÃO. NÃO SEI SE ALGUMA VEZ VI ALGO PARECIDO COM AQUILO”

Por outro lado, era preciso que esses jogadores - que vinham com contratos de curta duração - se integrassem e se acostumassem ao modelo de jogo inglês muito, muito rapidamente. Não havia muito tempo para que se adaptassem. Isto foi um desafio que precisei encarar imediatamente. 

Mas tínhamos muitos jovens jogadores de qualidade no plantel: Matej Vydra, Fernando Forestieri, Nathaniel Chalobah e muitos outros. Além de atletas experientes como Lloyd Doyley, Fitz Hall, Nyron Nosworthy, Marco Cassetti, Troy Deeney e Joel Ekstrand.  Eles foram cruciais na adaptação dos novatos .

Essa mescla de juventude e experiência ajudou a criar um ambiente positivo. Nos unimos rapidamente como grupo e isso fez com que estivéssemos juntos nos tempos difíceis. Havia apoio mútuo naquele elenco, assim como muita qualidade.

Troy Deeney marcou o gol decisivo na vitória do Watford na temporada 2012/13 nas semifinais do playoff da Championship. Dan Mullan/Getty Images
Troy Deeney marcou o gol decisivo na vitória do Watford na temporada 2012/13 nas semifinais do playoff da Championship. Dan Mullan/Getty Images

O resultado disso foi que pudemos jogar bem desde o primeiro jogo. E, apesar de não termos conquistado o acesso, criamos algumas memórias incríveis. Terminamos na terceira posição, e desfrutamos de um daqueles dias que não se esquece quando vencemos o Leicester na semifinal do playoff: Manuel Almunia defendeu um pênalti nos acréscimos e, na sequência, Deeney foi à área contrária para fazer o gol da classificação (acima). Todo mundo já viu esse vídeo. Vicarage Road entrou em erupção. Não sei se alguma vez vi algo parecido com aquilo. 

É disso que se trata o futebol, de momentos como aquele. Momentos que ficarão na memória para sempre e te deixarão arrepiado toda vez que pensar neles. Inclusive agora, estou arrepiado de lembrar daquele jogo. 

Situações assim criam um laço especial entre as pessoas que as viveram, e isso é eterno. Foi exatamente o que vivemos.

“SARRI É UM TREINADOR MUITO EXIGENTE, ESPECIALMENTE NA PARTE TÁTICA. ALGO QUE PODE SER EXTENUANTE PARA OS JOGADORES”

Eu amei a minha etapa ali, assim como aconteceu no West Ham - amei estar nos dois clubes -, mas o Chelsea é, e sempre será, a minha equipe. 

Portanto, quando apareceu a oportunidade de voltar para lá, não podia dizer não.

Chelsea é o lugar onde fui mais feliz. Lá, desfrutei de meu futebol mais do que em qualquer outro lugar. Então, retornar como treinador foi fantástico. 

Não cheguei como técnico principal, mas mesmo assim era algo incrivelmente emocionante.

Zola fez parte da comissão técnica do Chelsea que ganhou a Europa League em 2019 con Maurizio Sarri. Alex Grimm/Getty Images
Zola fez parte da comissão técnica do Chelsea que ganhou a Europa League em 2019. Alex Grimm/Getty Images

Voltei ao clube como auxiliar de Maurizio Sarri (acima) e aprendi muito com ele. É um técnico excelente; fantástico em organizar o time, preparar os jogos e estruturar os treinos para que se adequem a seus planos. 

Ele fez a equipe jogar um bom futebol. Talvez, não aconteceu tão rápido quanto gostaríamos, mas acredito que foi pelo tempo que os atletas necessitam para absorver as novas ideias. Ele é um treinador muito exigente, que dá muito valor aos treinamentos, sobretudo aos treinos táticos. Algo que pode ser extenuante para os jogadores.

“COMO AUXILIAR, VOCÊ ENXERGA AS COISAS DE UMA FORMA MAIS DISTANTE, O QUE TE AJUDA A ENTENDER MELHOR O JOGO”

Além disso, acho que Maurizio tomou algum tempo para entender o quão desgastante é a Premier League para os jogadores. Nem sempre é possível treinar tanto quanto você gostaria para o próximo jogo. Há muitas partidas e todas elas são competitivas. Às vezes, os atletas só precisam de descanso. 

Houve uma parte da temporada, durante o inverno, na qual tivemos alguns problemas e os jogadores praticamente rejeitavam o que fazíamos porque estavam muito cansados. Em retrospectiva, deveríamos ter identificado isso antes e feito trocas para ajudar os atletas. Por fim, fizemos e ficamos bem. 

Para mim, foi uma mudança trabalhar como auxiliar, mas pude aprender muito ao lado de um treinador como Maurizio. Estou verdadeiramente agradecido por essa oportunidade. A experiência só me ajudou a ser um melhor treinador.

Gianfranco Zola
Philip Haynes

Como auxiliar, você aprende e experimenta coisas, mas é como se estivesse no banco traseiro. Enxerga as coisas de uma forma mais distante, e isso é importante para te ajudar a entender melhor o jogo. 

Porém, a principal razão que fez do retorno ao Chelsea algo tão positivo foram os torcedores. Eles foram fantásticos - tal como eu esperava - e serão sempre assim comigo. Foi realmente especial. 

Foi um prazer voltar ao Stamford Bridge com eles e criar novas memórias ao lado deles. 

Temos uma conexão maravilhosa. 

E não há nada melhor que isso.