luis de la fuente
Treinador da Espanha, 2022-Presente
“Evoluir sem abrir mão de nosso estilo”.
Essa foi a resposta que dei quando me perguntaram sobre a minha ideia de jogo, ao ser apresentado como técnico da seleção sub-21 da Espanha, em 2018.
Conseguir apresentar ferramentas diferentes para lidar com todas as situações que surgem em uma partida.
Porque só o talento não basta.
Acredito que o trabalho duro supera o talento quando o talento não trabalha duro.
Felizmente, essa mensagem estava muito bem assimilada por aqueles jogadores. Eles têm as duas coisas naturalmente.
No futebol, assim como na vida, o que fica é o último instante. O sucesso imediato. Mas o triunfo que tivemos na Itália foi fruto de um longo processo de trabalho.
Com uma origem: a Eurocopa sub-19 disputada na Grécia, em 2014. Lá, aconteceu algo semelhante ao ocorrido no campeonato sub-21.
Estreamos vencendo a Alemanha por 3 a 0. Com essa vitória, quem via de fora tinha a impressão de que ganharíamos o campeonato com facilidade.
Mas nada é fácil no futebol. No segundo jogo, contra a Rússia, perdemos por 3 a 1.
Esse resultado embolou o grupo: estávamos muito perto de ficar de fora da competição. Uma situação ainda mais complicada de administrar para jovens de 19 anos, acostumados a vencer quase sempre com seus clubes.
No final, conseguimos a classificação após um empate angustiante contra a Holanda, que nos permitiu avançar porque tínhamos um melhor saldo de gols.
"GOSTO MUITO DE CONVERSAR SOBRE QUESTÕES CONCRETAS, ESPECÍFICAS E SER DIRETO COM OS JOGADORES"
Superada essa adversidade, depois vencemos a semifinal contra a França, e a final contra a Rússia.
Algo que evidenciou a força mental daquele grupo. Eles o demonstravam uma vez mais.
Para a Eurocopa sub-21, a mensagem foi simples e direta para convencê-los.
“Levem a campo o coração, o trabalho, o esforço e, acima de tudo, o companheirismo”. O significado disso era que as individualidades, que são excepcionais, deviam ser colocadas a serviço do coletivo.
Se fizéssemos assim, teríamos muitas chances de conquistar o título.
Porque a mensagem era esta: “Vamos ser campeões”. A repetimos várias vezes porque queríamos que ela ressoasse no grupo.
Não nos abalou o fato de termos perdido na estreia para a Itália. Uma derrota que quase nos eliminava da competição.
A equipe, assim como em 2014, superou todas as adversidades - vencemos a Bélgica sob um calor extremo; goleamos a Polônia, e viramos o jogo contra a França na semifinal - em nosso caminho até a decisão diante da Alemanha. O grande momento desta geração.
Dizem que tenho a fama de ser chato em minhas conversas com os jogadores.
“Caramba, professor”, os jogadores, às vezes, me dizem em tom de brincadeira, quando me exalto e alongo as palestras.
Admito a minha dificuldade em encurtá-las, mas tento controlar o tempo. Porque você não pode dar a um jogador uma palestra de 30 minutos. Depois de 20 minutos, ele já está desconectado.
Eu gosto muito de conversar sobre questões bem concretas, específicas e ser direto com eles.
Acho que é importante saber o que o jogador pensa. Como ele se sente em cada momento.
Eu costumava fazer isso quando era jogador do Athletic Club, do Sevilla e do Deportivo Alavés. Naquela época, costumava observar como meus companheiros de equipe reagiam às situações em que os técnicos os colocavam. A resposta que davam em campo a esse estímulo.
Essas experiências me permitem, agora, ter um critério.
Obviamente, é um critério pessoal. Não precisa ser válido para todos os jogadores e todas as equipes, mas sempre tento encontrar aquele ponto ideal que funcione para cada jogador.
Foi o que fizemos com vários jogadores, que chegaram ao torneio tendo pouco protagonismo em seus clubes. Não era o caso de se lamentar, procuramos o lado positivo: “Se você jogou menos partidas, estará mais fresco do que outros atletas que vinham de 50 jogos”.
Eles se convenceram disso e só precisaram de alguns jogos para entrar no ritmo. Quando aconteceu, ficaram animados com esse frescor nas pernas.
A conversa que tivemos antes do jogo com a Alemanha foi mais focada no lado emocional. Taticamente, não havia muito o que mexer. O nível da equipe tinha sido muito alto nos jogos anteriores.
“É a nossa chance. É o nosso jogo. A recompensa por tudo que construímos durante esse tempo”.
Depois, analisando aquela partida, ficou claro que tivemos uma atuação rica em diferentes aspectos futebolísticos, com as ferramentas que cada momento exigia.
Tivemos um primeiro tempo de muita qualidade na troca de passes. Mas também soubemos sofrer no início da segunda etapa, em um bloco baixo, onde mostramos que somos um grupo. E, o mais importante, fomos perigosos no contra-ataque.
"NA ESPANHA, TEMOS UM GRANDE DEFEITO. ALGO MUITO ‘MADE IN SPAIN’: SEMPRE ACREDITAMOS QUE O QUE VEM DE FORA É MELHOR”
Essa vitória mudou a vida dos jogadores. Dava para ver isso em seus rostos no caminho de volta a casa.
Muitos deles já estavam em grandes clubes, mas depois passaram a ter um status bem maior do que tinham antes daquela conquista. Ganharam prestígio e reconhecimento.
Espero também que aquela vitória sirva para reivindicar o talento do jogador espanhol, do qual sou um grande defensor.
Embora, na Espanha, tenhamos um grande defeito, algo muito ‘made in Spain’: sempre acreditamos que o que vem de fora é melhor.
Eu tenho a certeza de que sempre apostarei nesse tipo de jogador.
Porque sei que são uma aposta segura.
No meu caso, administro o sucesso com calma.
Ser treinador me tornou mais disciplinado.
Quando você é jogador, você também é jovem. E não consegue ver muitas coisas que, depois, enxerga como técnico. E pode interpretá-las e administrá-las da melhor maneira.
A exemplo da ideia de jogo que eu queria para aquela equipe, eu também fui evoluindo ao longo do tempo.
Dando sentido ao que faço, com ordem e equilíbrio.
Esse olhar em relação à vida, algo que não tinha antes, me permite ser feliz e estar muito satisfeito do que faço a cada dia.
Redacción: The Coaches' Voice